A soja é cultivada há séculos por povos asiáticos, principalmente os chineses, e surge como importante nutriente em meados do ano 1.000 d.C. Entretanto, somente a partir de 1.700 alguns pesquisadores europeus iniciaram os estudos da soja como fonte de óleo e nutriente animal. Conhecida como fonte proteica pelo valor nutricional e pela presença de ácidos graxos essenciais, a soja não contém colesterol e é uma boa fonte de minerais e de vitaminas, e tem longo histórico de consumo seguro.
Por esses motivos, tem sido um dos alimentos mais estudados na literatura científica. Além do valor nutricional, também é reconhecida por possuir vários compostos bioativos relacionados a diversos efeitos benéficos à saúde, principalmente na redução do risco de alguns tipos de câncer como de mama e próstata, osteoporose e doenças cardiovasculares, além da redução dos sintomas da menopausa, entre outras.
A soja precisa passar por tratamento térmico para ser consumida. De acordo com a pesquisadora Ilana Felberg, da Embrapa Agroindústria de Alimentos, assim como ocorre com outros vegetais, o grão possui fatores antinutricionais. Entretanto, estudos sobre a inativação de antinutrientes de soja e leguminosas são descritos há mais de 70 anos. “Os inibidores de tripsina são os que causam maiores preocupações, pois interferem na digestibilidade das proteínas. Entretanto, podem ser eliminados ou reduzidos por cozimento, tornando os grãos aptos a serem consumidos”, afirma.
A soja também contém oligossacarídeos que podem promover flatulência ou desconforto abdominal em algumas pessoas. Entretanto, não são considerados antinutricionais e sim prebióticos. Esses compostos são solúveis e reduzidos ao se descartar a água de ‘molho’ ou do cozimento. “Em relação ao consumo de grãos ou derivados, devemos lembrar que estamos falando de alimentos. Por isso, deve-se inserir dentro de uma rotina alimentar variada”, ensina a pesquisadora. Alguns trabalhos científicos sugerem que a faixa de consumo de alimentos à base de soja diariamente em países orientais fica entre 20g e 80g.
Menopausa
Estudos sugerem que a soja pode melhorar os efeitos da menopausa. A leguminosa é a principal fonte alimentar de isoflavonas que podem apresentar efeitos antiestrogênicos ou estrogênicos, dependendo do hormônio endógeno, quantidade e tipo de receptor de estrogênio. De acordo com a pesquisadora, estudos relacionando o consumo da soja e os efeitos positivos na redução significativa nos fogachos ou calores e sintomas correlatos durante a menopausa está bem documentado e continuam sendo publicados. “Por outro lado, ainda são publicados alguns trabalhos que relatam resultados contraditórios”, informa.
A pesquisadora ressalta que é preciso entender que são muitas as fontes de variação amplamente descritas na literatura sobre os estudos apresentados e que interferem nos resultados. Por exemplo, o tipo de estudo (ensaios in vitro, com animais, estudos clínicos com humanos, epidemiológicos, meta-análises); o desenho experimental, a amostragem (número de indivíduos testados), a forma de administração do composto (isolado ou alimento), a interferência da matriz alimentar, a dose ou quantidade consumida, o processamento ao qual o alimento foi submetido, a interferência da dieta, o tempo de duração do estudo e a intervenção ou avaliação.
Além disso, o metabolismo individual (genética e microbiota), a variação interindividual, os fatores externos que interferem na saúde dos indivíduos, a diferença de métodos analíticos e os resultados expressos em diferentes unidades são alguns fatores que interferem nos resultados. “Ainda temos variação das isoflavonas em função das condições ambientais de cultivo e da parte morfológica do grão utilizada (cotilédone, hipocótilo e casca). Com tantas possibilidades de variações entre estudos, fica mais claro entender por que encontramos tantos questionamentos e contradições”, informa.
Crianças
Há alguns rumores de que crianças devem consumir soja com moderação porque o alimento poderia prejudicar o crescimento e levar a alterações hormonais. No entanto, a pesquisadora relata que um estudo publicado no Brasil, em 2006, gerou preocupação em relação ao consumo de soja por crianças. “Na época, os autores relataram um estudo de caso de uma menina de quatro anos que apresentou telarca relacionada ‘à ingestão excessiva de soja e de outros alimentos ricos em fitoestrógenos’. Mais uma vez, estávamos diante de consumo considerado excessivo”, acentua. Por isso, independentemente de ser criança ou adulto, o que deve existir é bom senso no consumo.
A pesquisadora Ilana Felberg enfatiza que o fato que deve ser considerado em relação ao consumo de soja por crianças ou adultos se refere a indivíduos em situações de deficiência de iodo e/ou hipotireoidismo. “Temos artigos que concluem que as fórmulas infantis são seguras, e que somente crianças com hipotireoidismo congênito necessitam de monitoramento adequado da função tireoidiana”, reforça. Assim, o assunto deverá ser observado por profissional da área médica para esta avaliação.
Resultados de estudos com crianças mostram que o consumo não levou a alterações na saúde geral ou reprodutiva na vida adulta em comparação aos que consumiram formulados de leite. Por exemplo, um estudo de coorte retrospectiva foi realizado de março a agosto de 1999 entre adultos de 20 a 34 anos que, como bebês, participaram de estudos de alimentação controlada realizados na Universidade de Iowa. Neste estudo, 248 crianças foram alimentadas com fórmula de soja e 563 foram alimentadas com fórmula de leite de vaca durante a infância.
As principais medidas de resultado foram maturação puberal autorreferida, histórico menstrual e reprodutivo, altura e peso usual e saúde atual, comparado com base no tipo de exposição à fórmula durante a infância. “Outros autores avaliaram crescimento, saúde dos ossos, funções metabólicas, reprodutivas, do sistema endócrino, imunológicas e neurológicas e os resultados foram semelhantes aos observados em crianças alimentadas com leite materno e formulado de leite”, descreve.
Para a pesquisadora, a soja é um alimento nutritivo, versátil e saudável, apta para consumo pela maioria dos indivíduos que não têm restrição alimentar ou qualquer outra questão de saúde particular ao seu consumo. Restrições alimentares ou outras questões especiais devem ser avaliadas por profissional da área da saúde. “A soja tem um longo histórico de consumo seguro e a literatura científica nos traz muitos mais resultados de efeitos positivos à saúde do que preocupações”, finaliza. A Embrapa possui uma série de livros de receitas publicados que podem ser encontrados e baixados gratuitamente pelo site.