É fundamental o diagnóstico precoce

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Doença falciforme atinge entre 60 e 100 mil brasileiros

Escrito por: Fernanda Ortiz

Apontada como uma das alterações genéticas mais frequentes no mundo, a doença falciforme afeta principalmente a população afrodescendente. A enfermidade é uma condição hereditária caracterizada por uma alteração nos glóbulos vermelhos, dificultando a passagem do sangue pelos vasos de pequeno calibre e a oxigenação dos tecidos. Dados do Ministério da Saúde indicam que, atualmente, entre 60 e 100 mil pessoas no Brasil têm a doença. Apesar de não ter cura, a doença pode ser controlada. Para isso, é fundamental o diagnóstico precoce, tratamento multidisciplinar e acompanhamento médico contínuo.

Na doença falciforme, a hemoglobina produzida pelo organismo não funciona da maneira adequada. Isso ocorre em decorrência das alterações na forma das hemácias, que deixam de ter forma arredondada e elástica e assumem um formato de ‘meia lua’ ou ‘foice’. De acordo com a literatura médica, as células falciformes são direcionadas a formar grupos com outras hemácias e aderir aos vasos sanguíneos, dificultando a circulação do sangue e, consequentemente, a chegada de oxigênio aos tecidos. Por serem mais rígidas e destruídas facilmente, causam anemia – que é a forma mais grave e prevalente entre as doenças falciformes.

Genética, a doença ocorre quando a criança herda, tanto do pai quanto da mãe, o gene para produzir a hemoglobina S (Hb S) no lugar da hemoglobina normal (A ou Hb A), resultando na forma Hb SS. No entanto, quando a criança recebe o gene para a Hb S de apenas um dos pais será apenas portadora do traço falciforme (Hb AS). Neste caso, não apresentará a doença, mas poderá transferir o gene futuramente aos filhos. Os sintomas incluem crises de dor, infecções, icterícia, anemia, síndrome mão-pé, fadiga, complicações oculares e renais, entre outros.

“A gravidade clínica é variável, mas, a maioria das pessoas com a patologia apresenta as formas crônica e grave, exacerbada pelas crises”, explica a médica hematologista Vitória Regia Pereira Pinheiro, do corpo clínico do Vera Cruz Hospital e coordenadora do Programa de Triagem Neonatal do Centro Integrado de Pesquisas Oncohematológicas na Infância da Universidade Estadual de Campinas (Cipoi-Unicamp), em São Paulo. Assim, morbidade e mortalidade são resultado de infecções, de anemia hemolítica e de microinfartos decorrentes de uma vaso-oclusão microvascular difusa.

Teste do pezinho     

Considerado fundamental, o diagnóstico precoce dessa enfermidade pode ser feito ainda nos primeiros dias de vida, com o teste do pezinho. Em outras fases da vida – inclusive no pré-natal –, o diagnóstico é feito por meio do exame eletroforese de hemoglobina, que analisa e identifica os diferentes tipos de hemoglobinas encontrados no sangue. “Entre 2014 e 2020, a média anual de crianças diagnosticadas pelo Programa Nacional de Triagem Neonatal do Ministério da Saúde foi de 1.087, o que corresponde a 3,78 a cada 10 mil nascidos vivos”, informa a especialista. A distribuição dos casos é heterogênea, tendo maior incidência nas regiões do Distrito Federal, Bahia e Piauí.

De acordo com a médica, a assistência às pessoas com doença falciforme – como em toda doença crônica – deve privilegiar a atenção multiprofissional e interdisciplinar. Assim, os pacientes precisam ser acompanhados na atenção primária (unidades básicas de saúde), secundária (hematologistas, cardiologistas, neurologistas e outros) e terciária (hospitais de alta complexidade, urgência e emergência). “Além disso, o apoio familiar é muito importante para o sucesso do tratamento e para incentivar o paciente a ter uma vida normal, uma vez que a doença não acarreta alterações no desenvolvimento físico ou intelectual”, avalia. 

Expectativa de vida

Estima-se que os pacientes com doença falciforme têm uma expectativa de vida de 20 a 30 anos inferior a uma pessoa sem a doença. Dados mais recentes do Sistema de Informações de Mortalidade, do Sistema Único de Saúde (SUS) apontam que, entre 2014 e 2019, a maior parte dos pacientes faleceu na terceira década de vida (20 aos 29 anos). “Apesar desse cenário, a ciência tem feito avanços importantes, a exemplo de estudos com a técnica CRISPR, descoberta em 2012, em que é possível alterar genes mutados, inclusive os relacionados a doença falciforme”, detalha a médica. Apesar de iniciais, essas pesquisas abrem novas possibilidades de discussão sobre a doença.

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